A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2023, que tramita no Senado, propõe a autonomia orçamentária do Banco Central (BC), transformando-o de uma autarquia federal em uma empresa pública de direito privado.
Segundo especialistas consultados pela Agência Brasil, essa mudança representa uma espécie de “privatização” do BC e pode resultar em custos fiscais ao país, ao reter receitas que atualmente são transferidas para o orçamento da União.A PEC 65/2023 deve ser lida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na quarta-feira (19).
A proposta já tem o apoio de 42 senadores, sete a menos do que o necessário para uma mudança constitucional.A PEC prevê que os servidores do BC passem a ser regidos pela CLT, a Consolidação das Leis do Trabalho, em vez do regime estatutário da União.
O professor Pedro Paulo Zaluth Bastos, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), argumenta que essa medida pode comprometer as funções púbicas do BC de estabilização da moeda e promoção do pleno emprego.
“A PEC é uma espécie de privatização. Os lucros do BC, que atualmente vão para o Tesouro, poderiam deixar de ir para o Tesouro”, explicou.Bastos também alertou que a busca pelo lucro pode desviar o foco do BC de suas funções públicas.
“Isso pode levar o BC a priorizar lucro em vez de controlar a inflação, por exemplo, o que conflita com seu mandato público”, completou.BC PrivatizadoEntre 2018 e 2023, o lucro do BC com a senhoriagem foi de R$ 114 bilhões, com despesas acumuladas de R$ 23 bilhões no mesmo período.
Se a PEC estivesse em vigor desde 2018, o BC teria aproximadamente R$ 91 bilhões adicionais para gastos e investimentos.Um dos argumentos a favor da PEC é que o BC não precisaria mais usar recursos do Tesouro Nacional, aliviando o orçamento público. Contudo, Bastos acredita que o inverso pode ocorrer, pois as receitas do BC superam seu orçamento atual.
“O BC critica o gasto público, mas a PEC pode aumentar esse gasto”, comentou.Independência orçamentáriaO principal argumento da PEC, segundo o relator senador Plínio Valério (PSDB-MA), é que o BC deve operar “sem constrangimentos financeiros”. Com isso, o BC não dependeria mais dos repasses do Tesouro Nacional, utilizando receitas próprias para suas despesas e investimentos.
A PEC prevê que reajustes salariais dos funcionários fiquem limitados à inflação do ano anterior, e reajustes acima da inflação precisariam de autorização do Senado.
Portas giratóriasO professor de Sociologia Econômica Edemilson Paraná, da LUT University da Finlândia, destacou que a PEC fortalece o controle da política monetária pelos grandes bancos e instituições financeiras, citando a prática das “portas giratórias” – quando altos executivos do mercado financeiro ocupam cargos na administração pública e depois retornam ao mercado financeiro.
“Muitos gestores do BC têm vínculos com instituições financeiras. Então, autonomia de quem? Do povo, da democracia, da decisão política soberana do país”, disse.
Ele acrescentou que a PEC remove restrições orçamentárias que afetam outros órgãos públicos. “Querem se tornar exceções à regra de redução de despesas que eles mesmos defendem”, afirmou Paraná.
Para o economista Pedro Paulo, a ausência de estabilidade dos servidores do BC com a PEC pode comprometer a autonomia dos funcionários diante de pressões.Defesa da PECO senador Plínio Valério defende que a proposta está alinhada com os principais bancos centrais do mundo, onde a autonomia orçamentária e financeira é comum.
Valério afirmou que é possível impor limites ao uso dos lucros pelo BC, citando a Lei 13.820 de 2019, que prevê o uso dos resultados do BC para o pagamento da dívida pública.
“A experiência internacional mostra que os principais bancos centrais se submetem a processos rigorosos de supervisão, mesmo com elevada autonomia financeira.
Essa prática deve ser seguida na PEC apresentada”, completou o relator. Além disso, ele destacou a importância de regras claras que evitem a demissão imotivada dos futuros empregados do BC.(Com Agência Brasil).