Na Argentina, independentemente da sua ocupação – jovem engenheiro como Ramiro González* ou florista como Catalina Banach – o modus operandi predominante quando há um excedente monetário é a aquisição de dólares, seja por vias oficiais ou outras mais sombrias.
Como a Inflação Impacta o Poder de Compra
Em um cenário de flutuações econômicas, marcado por inflação mensal de quase 13% e anual de 138%, a incerteza política se intensifica com a aproximação de eleições presidenciais. Assim, a compra de dólares surge como estratégia para preservar o poder de compra.
Estratégias de González: Salário e Poupança
González, um engenheiro de 26 anos que trabalha em e-commerce, recebe um salário de aproximadamente 550 mil pesos (equivalente a R$ 3 mil pelo câmbio do mercado paralelo). Mesmo com reajustes frequentes no seu salário, a inflação faz com que seu poder aquisitivo em dólares diminua drasticamente. Ele disse ao InfoMoney: “Hoje ganho praticamente a metade em dólares do que ganhava quando comecei neste trabalho, há um ano”.
Após o recebimento, González prioriza as despesas essenciais e, em seguida, deposita parte do dinheiro em uma conta digital remunerada, a mais popular da Argentina. Nessa conta, os fundos acumulam um retorno impressionante de cerca de 100% ao ano. Contudo, vale ressaltar que a taxa básica de juros na Argentina é de 133%, uma forte discrepância se comparada à Selic brasileira de 12,75%.
Navegando Pelas Opções Cambiais
González transforma qualquer excedente em dólares. Ele já foi capaz de comprar até 200 dólares pelo câmbio oficial, mas após certas restrições governamentais, agora recorre ao “dólar bolsa” ou “dólar MEP”.
Este sistema envolve a compra e venda de títulos ou ações através de corretoras, permitindo a conversão de pesos em dólares. Outra opção são as “cuevas” – casas de câmbio ilegais que surgiram após restrições impostas em 2019. González afirma: “Tenho gente conhecida nas ‘cuevas’, consigo bons preços e eles entregam em casa”.
Estratégias Financeiras e Adaptações
Apesar das manobras financeiras, González confessa que, ultimamente, tem comprado poucos dólares. Suas despesas rotineiras e o cuidado com a propriedade da mãe limitam sua capacidade de poupança. Ele relembra: “Quando tinha 8 anos, 1 dólar valia 3 pesos”.
Catalina, por sua vez, enfrenta seus próprios desafios financeiros. Recebendo um valor semelhante ao de González, ela se divide entre cuidar de jardins, projetar jardins verticais e receber subsídios governamentais devido à condição de saúde do filho. Seu orçamento é consumido em grande parte pelos cuidados médicos do filho e despesas essenciais.
O Futuro Incerto com as Eleições
As eleições presidenciais iminentes não trazem otimismo para Catalina e González. Ambos expressam preocupação e incerteza sobre os candidatos e suas propostas. González, que já apoiou a sigla Juntos por el Cambio, está indeciso desta vez. Ele menciona: “A proposta de dolarização de Javier Milei [candidato de extrema-direita] me dá muito medo, mas as propostas dos outros também não me convencem”.
Catalina planeja votar em Patricia Bullrich, apesar de suas reservas sobre a candidata.
A Desconfiança nas Instituições Bancárias
Uma constante em meio às incertezas é a desconfiança no sistema bancário argentino. Para González, manter dinheiro em casa é uma opção mais segura do que confiar nos bancos. Esse sentimento é um reflexo de crises passadas, como o confisco bancário de 2001, que ainda molda o comportamento financeiro dos argentinos.