O cenário de águas em declínio é uma realidade na zona rural do município de Formosa do Rio Preto. Adão Batista Gomes, agricultor de 61 anos, observa que “uns anos atrás, o rio aqui da gente só ia baixar bastante no final de agosto para setembro”.
Atualmente, o nível do rio decresce rapidamente após o término das chuvas, uma vez que a extinção do Cerrado em suas cabeceiras não retém a água.
Impacto nas Nascentes e nas Comunidades Locais
Outra perspectiva vem de Jamilton Santos de Magalhães, ou Carreirinha, líder comunitário em Correntina. Ele lembra que o desaparecimento das nascentes tornou-se comum após os anos 90, afirmando que “começou o desmatamento, dois ou três anos depois começa o secamento das nascentes”.
Ambos, Carreirinha e Adão, são testemunhas vivas das transformações no Cerrado, que enfrenta desmatamento acelerado devido à expansão agrícola do Matopiba.
O Precioso Cerrado e seus Aquíferos
O Cerrado é reconhecido como “berço das águas” do Brasil, dando origem a oito das 12 principais bacias hidrográficas nacionais. Abastece também o Rio São Francisco e o Rio Paraná, cruciais para diversos países sul-americanos.
Uma pesquisa da revista “Sustainability” destaca a essencialidade deste bioma para a segurança hídrica e energética do país.
A Dinâmica da “Floresta Invertida”
Segundo Yuri Salmona, doutor em Ciências Florestais, as raízes das árvores do Cerrado, descritas como “floresta invertida”, têm a capacidade de absorver e reter água das chuvas, liberando-a gradualmente. O desmatamento interrompe este ciclo, levando a erosão e variações extremas no fluxo de água.
Os Desafios do Agronegócio
O estudo revela uma redução média de 15,4% na vazão dos rios do Cerrado entre 1985 e 2022. Até 2050, essa vazão pode diminuir ainda mais.
Paralelamente, há uma exportação indireta de “água virtual” para países como China e EUA, através da exportação de commodities.
Gestão de Recursos e Política
A transparência nas concessões de água no Cerrado é uma preocupação. Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Cerrado, questiona os critérios e limites dessas concessões.
As populações locais também têm denunciado o uso excessivo de água na agricultura, como foi o caso em Correntina em 2017.
Posicionamento Governamental
Em um debate recente no Senado, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, anunciou planos para combater o desmatamento no Cerrado.
Ela sublinhou a necessidade de rever licenças de desmatamento e a importância da colaboração entre estados. No entanto, muitos questionam a eficácia das medidas em meio a pressões externas e interesses comerciais.
Agronegócio e Sustentabilidade
Tentativas de contato com representantes do agronegócio, como a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), foram feitas para obter suas perspectivas sobre o desmatamento do bioma.